Shofetim (שופטים, Juízes)
Deuteronômio 16:18 – 21:09
A porção dessa semana gira basicamente ao redor de um só
tema: a organização social de uma comunidade. O texto explicita os cargos
necessários para a vida em sociedade: magistrados e juízes, guardas, governantes,
levitas e profetas. No entanto, talvez numa visão utópica de mundo, a Cabalá
afirma que se vivêssemos em um estado ideal e perfeito, a rigor não
precisaríamos de figuras como juízes, guardas e governantes. Ou seja, o fato de
o texto pedir que tenhamos esse tipo de cargo em nossa sociedade é prova de que
ainda vivemos em um estado aquém do ideal, em que é preciso impor regras e
estabelecer limites.
Conta-se que certa vez, o Rabi Shimon ben Halafta viu uma
série de formiguinhas em fila carregando pedacinhos de trigo. Ele reparou,
então, que uma das formiguinhas derrubou o seu grãozinho de trigo e que,
embora, todas as outras formigas vieram cheirar o grão caído, nenhuma delas
tocou nele; até que a formiga à qual o grão pertencia veio e o recolocou sobre
as costas. Espantado com o que vira, o Rabi Shimon se lembrou do
Provérbio que diz “Observa a formiga, ó preguiçoso, estude seus caminhos e
adquira sabedoria” (6:6). Nesse momento ele ficou extremamente maravilhado com
a sabedoria daquela criatura e a retidão de caráter que demonstravam em
comunidade. Mesmo sem juízes ou guardas regendo a sua sociedade, nenhuma
formiga ousou pegar o grão que era da formiga que o deixara cair.
Imediatamente, então, o Rabi Shimon sentiu-se pesaroso por
saber que o ser humano, longe de tal estado de integridade, precisava receber
ordens explícitas de nomear juízes e guardas sobre o povo. Daqui podemos aprender duas coisas importantes: a primeira é
que muitas vezes seres que alguns humanos consideram “inferiores” (aliás, de
maneira totalmente errônea) estão muito além do nosso nível e possuem lições
valiosíssimas a nos ensinar, em diversos aspectos.
Em segundo lugar, aprendemos a importância em se reconhecer
e resolver um problema real que temos (no caso literal do texto, o de que não
temos uma conduta social de integridade), sempre almejando, no entanto, que um
dia cheguemos a tal grau de perfeição que possamos eliminar de dentre nós os
juízes e guardas. Obviamente, podemos enxergar nesse segundo ponto uma lição
mais ampla do que à literal aplicada a esse caso. Sempre que detectamos um
problema em nós, antes de mais nada devemos reconhecê-lo (em vez de fingir que
ele não existe) e nomear juízes e guardas para tratar de erradicá-lo. Uma vez
que isso é feito de maneira exemplar, nosso eu muda, nosso comportamento se
retifica e podemos alegremente demitir essas autoridades do nosso mundo
interno, pois então somos como formigas, naturalmente justas e íntegras. Y. A. Cabalista
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