A
menina que cresce hoje não deixa de ser delicada e romântica, apenas
detesta limitações. A velha versão do conto de fadas jogava com a
contradição entre a boa mãe, encarnada pela finada e a fada (versões da
mãe da primeira infância) e a madrasta-bruxa ( representante da mãe da
adolescente), que deixa de cuidá-la para disputar no mesmo território,
invejosa e envelhecida. A versão que tenta resgatar
Cinderela, encontramos uma mãe mais do que má, retrógrada, incapaz de
entender a vastidão dos destinos de uma mulher, só pode oferecer velhas
fórmulas. A outra mãe era ótima, mas morreu. Trata-se de uma ou várias
gerações de mulheres órfãs de mãe, não que não as tenham, mas estas
tampouco tem respostas, apenas questões, dúvidas, culpas, problemas de
agenda, dificuldades para encaixar seus múltiplos papéis. Já não mais
modelo, agora parceira de aventuras, descortina-se um espaço
interessante de convívio, falta porém a figura da guia.
As novas meninas precisam encontrar desde cedo os modelos em que pautar esse jeito nada apagado de ser, o conto de fada contemporâneo, ou seja, o cinema, é um lugar privilegiado aos modelos que vieram em substituição da velha e submissa Cinderela, da desfalecente Bela Adormecida ou da ingênua Branca de Neve.
As novas meninas precisam encontrar desde cedo os modelos em que pautar esse jeito nada apagado de ser, o conto de fada contemporâneo, ou seja, o cinema, é um lugar privilegiado aos modelos que vieram em substituição da velha e submissa Cinderela, da desfalecente Bela Adormecida ou da ingênua Branca de Neve.
A liberdade das novas mulheres traz a dolorosa consciência da condição
pantanosa do chão que pisamos: os patriarcas fraquejam, envelhecem,
vacilam, os amados já não são também futuros respeitaveis senhores de
bigode. À mulher independente corresponde um homem sensível, cujo melhor
modelo é o rapazola romântico de Titanic. Perdida a ilusão da fortaleza
masculina a mulher encontra novo tipo de fragilidade, frente a esta
está só, como Lara Croft, sobrevivente, dependente apenas de suas
habilidades para seguir adiante.
É preciso preparar as mulheres para a complexidade de seu novo papel,
aí mais uma vez o cinema faz sua parte. Às mulheres principiantes este
último ano foram oferecidos dois filmes: Mulan (estúdios Disney) e o
menos comentado A Espada Mágica (estúdios Warner). Trazem trama similar:
duas jovens são forçadas a percorrer um destino de guerreiras e o fazem
com mestria. Mulan salva toda a China da dominação Mongol e a outra
salva um rei que não é outro senão Arthur. Ambas passaram
por revezes no começo, pois revelavam-se inadequadas para o casamento e
as tarefas do obscuro papel destinado às mulheres. Antes de demonstrar
seu surprendente desempenho na terra dos homens, afinal não há espaço
mais masculino do que a guerra, passaram por um estado extremamente
incômodo no qual não eram aceitas em nenhum dos mundos. Mulan é uma
lenda chinesa da qual não conhecemos muitos paralelos no ocidente,
apenas para situar em termos de literatura brasileira, temos nossa
Diadorim passeando os impasses da nova mulher pelo Grande Sertão
Veredas.
A
mulher tem seu próprio método para ir à guerra, não canta para espantar o
medo, ela se apavora, desce ao abismo e sobe com consciência de seus
limites. Curiosamente, sua recompensa para além da pompa e da glória,
provém acima de tudo do amor. Assistimos pasmados à jovem Mulan sobrepor
em importância o amor de um jovem guerreiro e o perdão de seu pai pela
travessura, à própria consagração de sua coragem na Praça Imperial. A
glória por ela conquistada seria suficiente para inebriar qualquer
homem, mas para a mulher nada significa sem o amor. Toda ovação popular
só é audível quando o guerreiro que conquistou seu coração atravessa o
portão da casa paterna para pedir sua mão.É digno de nota que este amor é
o por ela escolhido, não o designado pela rigidez da tradição.
Não faltaram em tempos anteriores mulheres diferentes, aquelas que
dedicaram vidas a causas humanitárias, científicas, religiosas ou
políticas. Estas aventureiras do destino feminino, outrora exceções,
tornaram-se hoje a regra. Hoje os caminhos para a mulher são menos
marcados, a reivindicação já não é tanto de novos espaços, mas que mais e
mais mulheres possam ter liberdade de escolher a causa em nome da qual
dedicar sua vida, seja ela social ou doméstica, pública ou privada, amorosa ou celibatária.
Os contos de fada, que tantas gerações escutaram antes de
dormir, precisam ser incluídos na bagagem da nova mulher, mas não mais
daquele jeito. Já não são mais só contados, agora necessáriamente
possuem imagens, o cinema faz parte desta transmissão de histórias.
Existe um filme recente que tenta uma saída para Cinderela, chama-se: “Para sempre Cinderela”. No filme descobrimos que ela não era boba e submissa como pensávamos e sim inteligentíssima e letrada. A jovem orfã teve tempo de ser introduzida não só ao gosto pela leitura por seu pai, mas também ao uso das espadas, o resultado é uma moça muito moderna, cujo único problema é que talvez não possamos chamar de Cinderela tão simpática personagem.
Existe um filme recente que tenta uma saída para Cinderela, chama-se: “Para sempre Cinderela”. No filme descobrimos que ela não era boba e submissa como pensávamos e sim inteligentíssima e letrada. A jovem orfã teve tempo de ser introduzida não só ao gosto pela leitura por seu pai, mas também ao uso das espadas, o resultado é uma moça muito moderna, cujo único problema é que talvez não possamos chamar de Cinderela tão simpática personagem.
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